Respostas aos céticos

richard_layardRichard Layard, co-fundador do movimento, responde a algumas das visões céticas que foram colocadas sobre a importância da felicidade.

Nosso movimento, assim como esperávamos, provocou um grande debate sobre os objetivos de nossa sociedade. Nós regozijamos com isso e somos gratos a todos que tomaram tempo para colocar suas opiniões, tanto a favor quanto contra. Mas pensamos que os argumentos de muitos dos críticos se baseiam em mal-entendidos. Aqui estão algumas das questões principais, junto com nossos comentários.

Felicidade não é apenas um conceito vago e subjetivo?

Claro que as causas da felicidade diferem amplamente entre as pessoas. Alguns gostam de silêncio, outros de barulho; alguns gostam de estudar, outros não. Obtemos felicidade de coisas diferentes. Mas todos sabemos o que é estar feliz — e sofrer. É uma questão que envolve nossos sentimentos. O que importa é como nos sentimos em geral, em vez dos altos e baixos a curto prazo.

Se quisermos saber como está nossa sociedade, devemos perguntar às pessoas sobre suas vidas. Essa é a medida adequada da qualidade de vida. O que importa, de modo último, é a experiência de vida das pessoas. A experiência é subjetiva, e é exatamente por causa disso que ela importa. A dor é subjetiva, assim como o contentamento.

Queremos uma sociedade que crie o mínimo possível de dor física e mental, assim como o máximo de alegria e contentamento. A dor pode vir de diferentes lugares, assim como a felicidade. Mas todos sabemos quão bem ou mal nos sentimos, e a maioria das pessoas não encontra dificuldade em responder questões sobre esse assunto.

Mesmo assim, muitas pessoas que respeitamos têm dificuldade com a palavra felicidade porque ela é subjetiva. Mas em nossa visão, isso reflete um ponto importante ligado ao motivo de este movimento ser necessário, que é o fato de que muitas pessoas resistem encarar a experiência subjetiva de modo sério o suficiente. Nossa sociedade seria mais feliz se levasse a felicidade mais a sério e desse a ela maior prioridade.

Falar de felicidade não encoraja o egoísmo?

Se encorajasse, nós jamais teríamos criado a Ação para Felicidade. Porque, bem obviamente, se as pessoas buscassem apenas sua própria felicidade não teríamos uma sociedade feliz. Nosso movimento não é sobre isso; mas sim sobre criar uma sociedade em que todos são mais felizes, porque todos contribuem para a felicidade dos outros.

É por isso que nossos membros fazem o compromisso de criar mais felicidade no mundo e menos sofrimento. Se um número suficiente de nós encarasse a vida dessa maneira, iríamos ver dois resultados principais: primeiro faríamos outras pessoas mais felizes, e segundo nós mesmos seríamos mais felizes.

Então você pode perguntar por que afinal falar de felicidade? Por que não falar de altruísmo, auto-sacrifício ou dever? Porque precisamos de uma ideia clara sobre o que estaríamos fazendo ao cumprir nosso dever — o mundo seria um lugar melhor se “dever” significasse: criar o máximo possível de felicidade e o mínimo de sofrimento.

Se todos adotarmos essa visão, em nossas vidas familiares, no trabalho e em nossas comunidades, teríamos um mundo bem diferente: um mundo melhor.

Falar de felicidade não encoraja a lassidão?

Pessoas com frequência se opõe dizendo que “trabalho duro e sacrifício são necessários, para chegar a algum lugar. Fale de felicidade e as pessoas buscarão gratificação instantânea.”

Isso é absurdo. Por toda a história pessoas têm sacrificado a felicidade presente em nome da felicidade futura ou pela felicidade de seus filhos ou da sociedade. Com frequência precisamos sacrificar a felicidade hoje para um bem maior, mas essa justificativa precisa ser uma felicidade maior no final da estrada, e não um caminho de penitência sem fim.

Algum sofrimento não é inevitável ou até benéfico?

É claro que certo grau de sofrimento jamais poderá ser eliminado da vida humana. Mas há algo estranho no argumento de que a angústia pode ser boa para você — porque ela indica que você precisa mudar. O argumento parte do princípio de que você não gosta de sofrer, de outro modo você não iria querer mudar. Também assume que as coisas vão melhorar e quando você mudar, presumivelmente, será mais feliz.

Um argumento mais sério é que para ter paz mental precisamos aceitar as coisas que não podemos mudar, como diz a prece da serenidade. Então, se estivermos sofrendo, devemos não tornar as coisas piores ao reafirmar para nós mesmos que o sofrimento é uma tragédia.

No entanto, quando se trata de outras pessoas, devemos responder de modo diferente. Devemos considerar seu sofrimento um desastre e não, como se diz às vezes, uma oportunidade abençoada para que eles mostrem a grandeza de seu espírito. Quando olhamos para o mundo, um objetivo principal deve ser a redução do sofrimento.

Não há risco de um otimismo impensado ignorar problemas reais?

Ao lidar com nossas emoções, o otimismo não é uma desvantagem, pelo contrário. Nossa felicidade depende amplamente de onde direcionamos nossa atenção. Se considerarmos as coisas favoráveis, somos muito mais felizes do que se focarmos na metade vazia do copo.

Para algumas decisões, o realismo é melhor, especialmente em questões financeiras. Mas em geral pessoas otimistas têm melhor capacidade para lidar com fracassos, mesmo se elas às vezes são mais otimistas do que o realismo justificaria.

Otimismo não é ser irrealista. É sobre focar nas coisas que são boas e em caminhos positivos adiante, em vez de empacar em pequenas questões e negatividade.

Além disso, ao pensar sobre outras pessoas, imparcialidade e realismo são essenciais. Este movimento não é o otimismo de avestruz de um Doutor Pangloss, que imagina que os problemas do mundo podem ser solucionados com pensamentos e boa vontade, sem ação. Pelo contrário. E, com frequência, a ação precisa ser executada pelos governos [que, por sua vez, precisam ser influenciados por pessoas e movimentos].

Felicidade não é um subproduto?

Aqui de novo, a mesma lógica se aplica. Se quisermos ajudar outras pessoas, isso significa ajudá-las a ter vidas mais felizes — fazendo o que pudermos no cotidiano, e através das grandes escolhas que fazemos em relação à nossa família, trabalho e comunidade.

Mas quando pensamos sobre nós mesmos, precisa ser um pouco diferente. Não devemos ficar constantemente perguntando: “eu sou feliz?”. Em vez disso, continuamos fazendo algo útil ou belo, que nos engaje totalmente.

Mas há ocasiões em que precisamos nos examinar, nos perguntar por que estamos descontentes, encontrar uma maneira melhor. Algumas das mudanças necessárias podem dizer respeito a nossa vida externa (por exemplo, o equilíbrio entre vida pessoal e trabalho, ou nossos objetivos), enquanto outras são questões internas. Neste website, há muitas maneiras através das quais podemos lidar com nossas emoções e alcançar maior harmonia e alegria. John Stuart Mill estava errada quando afirmou que não devemos nunca olhar para dentro. Quando precisamos, devemos fazer isso.

Esse movimento não é uma distração em relação à atual crise econômica (na Europa)?

Muito longe disso. Um dos motivos da crise são as prioridades erradas do passado. Banqueiros insistiam que a desregulamentação dos bancos era necessária para o aumento no crescimento econômico. Isso, diziam eles, era um objetivo mais importante que o estabilidade econômica de curto-prazo. O resultado é que a desregulamentação seguiu adiante, mesmo já sendo prevista a maior probabilidade de instabilidade (que se confirmou).

Se, em vez disso, tivéssemos olhado o que realmente importa para as pessoas, teríamos visto que estabilidade econômica é bem mais importante, e crescimento econômico a longo-prazo é muito menos. Uma prioridade de nossa sociedade [Inglaterra] agora é reduzir o desemprego, que é um dos grandes inimigos da felicidade.

No que se refere a questões políticas atuais, nosso movimento inclui pessoas de todos os partidos. Não há nenhuma agenda oculta. Acreditamos que tanto indivíduos quanto governos devem fazer tudo que puderem para produzir mais felicidade no mundo e menos miséria — baseando suas ações nas melhores fontes possíveis de sabedoria e conhecimento.

Não é perigoso se governos tentarem criar felicidade?

Há um medo comum de que governos tentando promover a felicidade vão se tornar excessivamente “mandões” — o Estado Babá. É um medo fora de lugar. Há evidências massivas da importância imensa da liberdade como uma causa da felicidade. Os países mais tristes já registrados estavam no bloco soviético. Ninguém que se baseie em evidências para promover a felicidade cairia nessa armadilha.

A liberdade é importante de várias maneiras. Há liberdade em relação a prisões arbitrárias, liberdade para expressar sua opinião e por aí vai. Mas também há liberdade para escolher seu emprego e estilo de vida. Foi por esse motivo que Adam Smith pregou sobre a importância do livre mercado e, ao mesmo tempo, apelou para que os governos promovessem a felicidade. Essas duas coisas não se contradizem.

Como vivemos em sociedade, somos profundamente afetados pelo modo como as outras pessoas se comportam. Ao irmos enriquecendo, isso assume importância cada vez maior. Então agora vemos os governos reorientando seus interesses na direção do comportamento. Isso é bom. Não queremos uma sociedade de conformistas, mas sim uma sociedade onde as pessoas realmente se importem com a felicidade uns dos outros.

Como Thomas Jefferson, que não era nem um pouco conformista, disse: “Cuidar da vida humana e da felicidade, e não de sua destruição, é o único objeto legítimo de um bom governo”. E, para fazer isso, os governos precisam medir a felicidade.

Medir a felicidade com exatidão é uma ideia louca?

Todos os partidos políticos britânicos agora apoiam a ideia. Assim como o clube das nações ricas (a OECD) e muitos outros governos individuais. Tal medição não é novidade. A felicidade tem sido medida regularmente nos EUA desde os anos 50. No Eurobarômetro da União Européia isso começou nos anos 70. A novidade é que agora essas medições estão sendo feitas em larga escala e recebendo status oficial.

Isso tudo vem para o bem, porque se você medir a coisa errada, vai fazer a coisa errada. Governos começaram a medir o PIB com o objetivo de lidar com desemprego, mas então permitiram que isso se tornasse o totem do sucesso nacional. Isso só confirma os valores materialistas e consumistas da sociedade como um todo. É ótimo que agora isso esteja mudando.

O objetivo dessa medição é ver quem está com a satisfação em processo de degeneração e, tendo encontrado as causas, adotar políticas para melhorar as coisas. Para descobrir isso, pessoas são questionadas sobre quão felizes estão, quão satisfeitas com a vida em suas diferentes áreas, e por aí vai. Muitas pessoas respondem essas medições, mas elas significam alguma coisa? As respostas são, intencionalmente, totalmente subjetivas. Mas elas estão bem-correlacionadas com todos os tipos de medições objetivas.

Primeiro, se correlacionam com a atividade cerebral nas áreas relevantes, em que sentimentos positivos ou negativos são vivenciados. Segundo, se correlacionam com comportamento — pessoas que afirmam estar infelizes no trabalho tendem a deixar o emprego. Terceiro, o que as pessoas dizem se correlacionam bem com as causas óbvias de felicidade e sofrimento, como o desemprego. E quarto, o que uma pessoa diz sobre sua felicidade é repetido por o que um amigo diz sobre ele — se não pudéssemos perceber os sentimentos subjetivos de cada um, a sociedade humana seria impossível.